ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
Influência da posição de parto vaginal nas variáveis obstétricas e neonatais de mulheres primíparas
Sabrina Mattos Baracho 1 Elyonara Mello de Figueiredo 2 Lucas Barbosa da Silva 3 Izadora Carolina Araújo Gonçalves Cangussu Daniele Nunes Pinto 5 Elza Lúcia Baracho Lotti de Souza 6 Agnaldo Lopes da Silva Filho 7
The influence of vaginal birth position on obstetric and neonatal variables in primiparous women
1,6,7
Grupo
de
Pesquisa
em
Disfunções
do
Assoalho
4
Pélvico,
Hospital das Clínicas. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG, Brasil. Escola
2,4,5
de
Educação
Física,
Fisioterapia
e
Te r a p i a
Ocupacional. Departamento de Fisioterapia. Universidade Federal d e M i n a s G e r a i s . Av. A n t ô n i o C a r l o s , 6 6 2 7 , C a m p u s P a m p u l h a . Belo
Horizonte,
M G,
Brasil.
CEP:
31270-901.
E-mail:
[email protected] 3
Abstract
Hospital Sofia Feldman. Belo Horizonte, MG, Brasil.
Resumo
Objectives:
of
O b j e t i v o s : d e t e r m i n a r a p re v a l ê n c i a d e f a t o re s
obstetric factors associated with vaginal birth posi-
obstétricos associados à posição de parto vaginal
tion
(PPV) – vertical ou horizontal; investigar correlações
(VBP)-
to
determine
vertical
or
the
horizontal;
p re v a l e n c e
to
investigate
correlations between VBP and obstetric factors and
e n t re
neonatal characteristics.
influência sobre as características neonatais.
PPV
e
f a t o re s
obstétricos,
bem
como
sua
Methods: a cross-sectional study was carried out.
Métodos: foi realizado um estudo de corte trans-
The sample comprised 176 primiparous women who
v e r s a l . A a m o s t r a f o i c o m p o s t a p o r 1 7 6 m u l h e re s
had
primíparas
given
february
birth
2007.
v a g i n a l l y,
between
c o r re l a t i o n
july
and
que
re a l i z a r a m
parto
vaginal,
e n t re
julho/2006 e fevereiro/2007. Foi investigada a corre-
between VBP and the following obstetric variables:
lação entre PPV e as seguintes variáveis obstétricas:
o c c u r re n c e
ocorrência e grau de laceração perineal espontânea,
severity
of
was
2006
investigated
and
The
spontaneous
perineal
l a c e r a t i o n s , e p i s i o t o m y, p e r i n e a l s u t u re , t h e u s e o f
episiotomia,
oxytocin
instrumentação cirúrgica. Os neonatos foram classi-
w e re
and
s u rg i c a l
characterized
instruments.
a c c o rd i n g
to
The
newborns
gestational
sutura
perineal,
uso
de
ocitocina
e
age,
ficados quanto à idade gestacional, peso, estatura,
weight, height, head circumference and one- and five-
perímetro cefálico e Apgar 1° e 5° minutos. Teste qui-
minute Apgar. The chi-squared test was used to inves-
q u a d r a d o f o i a p l i c a d o p a r a i n v e s t i g a r c o r re l a ç ã o
tigate the correlation between VBP and obstetric vari-
entre PPV e variáveis obstétricas e o teste t-student
ables and Student’s t-test to investigate differences in
para investigar a influência da PPV nas caracterís-
neonatal characteristics according to VBP.
ticas neonatais.
Results: no association was found between VBP
R e s u l t a d o s : n ã o f o i o b s e r v a d a c o r re l a ç ã o e n t re
a n d p e r i n e a l s u t u re , p e r i n e a l l a c e r a t i o n , t h e u s e o f
PPV e sutura perineal, laceração perineal, uso de
o x y t o c i n , e p i s i o t o m y o r t h e u s e o f s u rg i c a l i n s t r u -
ocitocina, episiotomia e utilização de instrumentação
m e n t s ( f o rc e p s o r v a c u u m - e x t r a c t o r ) . T h e re w a s a
cirúrgica (uso de fórceps ou vácuo-extrator). Houve
c o r re l a t i o n
between
VBP
and
episiotomy
and
a
g re a t e r p re v a l e n c e o f e p i s i o t o m y f o r t h e h o r i z o n t a l
c o r re l a ç ã o
position. VBP had no influence on the characteristics
Não
of the newborn.
neonatais.
C o n c l u s i o n s : e p i s i o t o m y w a s m o re p re v a l e n t i n cases of horizontal birth position, although both birth
e n t re
PPV
e
episiotomia
e
maior
p re v a l ê n c i a d e e p i s i o t o m i a n a p o s i ç ã o h o r i z o n t a l . houve
influência
Conclusões:
da
houve
PPV nas
maior
características
ocorrência
de
episiotomia na posição de parto horizontal, embora
p o s i t i o n s a re s a t i s f a c t o r y a s f a r a s t h e n e w b o r n i s
ambas as posições de parto tenham sido satisfatórias
concerned.
para os neonatos.
Key words
Natural childbirth, Humanizing delivery
Palavras-chave
Parto normal, Parto humanizado
Rev. Bras. Saúde Matern. Infant., Recife, 9 (4): 409-414 out. / dez., 2009
409
Baracho SM et al.
maternas
Introdução
adotadas
durante
a
fase
expulsiva
do
trabalho de parto vaginal. 13 No entanto, ainda são Aproximadamente 85% das mulheres que realizam
escassos
parto vaginal sofrem algum tipo de trauma perineal,
mulheres brasileiras que realizaram partos vaginais
os
dados
sobre
as
características
das
incluindo lesões das estruturas de suporte de tecido
verticais com sucesso, e sobre a relação desses com
conectivo da pelve, das estruturas vasculares, dos
ocorrências obstétricas relevantes para a função do
nervos
e/ou
músculos
ou
diretamente
do
trato
urinário. 1 Esses traumas são resultantes de lace-
assoalho pélvico das parturientes assim como para a saúde de seus neonatos.
rações perineais espontâneas ou de episiotomia. 2,3
O presente estudo objetivou identificar a associ-
Tais lesões podem levar, em curto prazo, ao aumento
ação entre a posição de parto vaginal e a presença e
da perda sanguínea, à necessidade de sutura e à dor
grau
perineal
episiotomia, de sutura perineal, uso de ocitocina e de
no
pós-parto. 4
Além
disso,
o
trauma
de
laceração
perineal
espontânea,
de
perineal decorrente do parto vaginal tem sido apon-
instrumentação cirúrgica em mulheres primíparas.
tado como importante fator de risco para o surgi-
Além disso, buscou investigar a associação entre a
mento de disfunções do assoalho pélvico, incluindo-
posição de parto vaginal horizontal ou vertical e as
se as incontinências urinária e fecal e os prolapsos
características dos neonatos.
dos órgãos pélvicos. 4,5 Tais disfunções são responsáveis por altos custos para o sistema de saúde e por impacto
negativo
na
qualidade
de
vida
dessas
Métodos
mulheres.6 O risco de ocorrência de trauma perineal durante
Trata-se de um estudo observacional, retrospectivo,
o parto vaginal é multifatorial. Fatores obstétricos e
de corte transversal, em que foi feito levantamento e
neonatais, tais como a realização de episiotomia,
análise
segundo estágio do trabalho de parto prolongado,
realizaram parto vaginal, no período de julho de
dados
de
mulheres
primíparas
que
uso de ocitocina, parto vaginal assistido a fórceps ou
2006 a fevereiro de 2007, no Centro de Parto Normal
vácuo-extrator, recém-nascido com peso superior a
(CPN) Doutor David Capistrano Filho, do Hospital
4000 g e nuliparidade estão associados à ocorrência
Sofia Feldman, uma instituição filantrópica ligada
de lacerações perineais.5,7 Alguns desses fatores não
ao Sistema Único de Saúde que presta assistência
são passíveis de intervenção como, por exemplo, o
humanizada ao parto, localizada em Belo Horizonte,
peso
Minas Gerais, Brasil.
do
recém-nascido
ou
a
nuliparidade.
No
entanto, outros são modificáveis e condutas alterna-
Foram incluídos dados de mulheres primíparas
tivas têm sido propostas para minimizar os possíveis
com idades entre 18 e 40 anos, com feto único, idade
efeitos negativos do parto vaginal sobre as estruturas
gestacional entre 37 e 40 semanas, que realizaram
do assoalho pélvico.8
parto vaginal. Foram excluídos dados de mulheres
A posição vertical da mulher em relação à hori-
com desordens neurológicas e história de aborto
zontal durante o parto vaginal parece constituir um
prévio. As participantes elegíveis foram identifi-
desses fatores por abreviar o período expulsivo. 8,9
cadas a partir do livro de registros do setor de enfer-
Benefícios dessa posição incluem o efeito facilitador
magem do CPN. As variáveis dependentes do estudo
da força da gravidade, maior eficiência e intensidade
foram: presença e grau de laceração perineal espon-
na força de contração uterina, a redução do risco de
tânea, realização de episiotomia e de sutura perineal,
compressão aorto-cava e consequente melhor oxige-
uso
nação fetal na fase expulsiva do trabalho de parto, e
(fórceps ou vácuo-extrator); idade gestacional, peso,
de
ocitocina
e
de
instrumentação
cirúrgica
aumento dos diâmetros pélvicos ântero-posterior e
estatura e perímetro cefálico do neonato e Apgar no
transverso nas posições de cócoras e ajoelhada. 10,11
1° e 5° minutos. A variável laceração perineal espon-
Além disso, a verticalização parece oferecer maior
tânea foi categorizada de acordo com os critérios
conforto às parturientes e um melhor intercâmbio
estabelecidos pelo Royal College of Obstetricians
materno-fetal, diminuindo o risco de asfixia fetal.12 Atualmente, o Ministério da Saúde do Brasil
and Gynaecologists:14 laceração de 1º grau (lesão de mucosa), de 2º grau (lesão envolvendo a musculatura
preconiza a assistência humanizada ao parto, de
perineal, mas não o esfíncter anal), de 3º grau (lesão
modo
próprio
envolvendo o complexo esfincteriano anal) e de 4º
processo de parto, respaldada por orientações funda-
grau (lesão envolvendo o complexo esfincteriano
que
mentadas
410
dos
a
mulher
em
deve
conduzir
confiáveis
anal e a mucosa retal). A posição de parto vaginal
acerca dos possíveis benefícios, relativos ao bem-
constituiu a variável independente do estudo e foi
estar
categorizada, de acordo com Soong e Barnes 8 como
materno
informações
e
fetal,
das
válidas
seu
e
diferentes
posições
Rev. Bras. Saúde Matern. Infant., Recife, 9 (4): 409-414 out. / dez., 2009
Posição de parto vaginal, variáveis obstétricas e neonatais
vertical
(sentada,
semissentada,
cócoras
e
de
o parecer número 10/2006.
joelhos/Gaskin) ou horizontal (decúbito dorsal ou litotomia, decúbito lateral esquerdo). Análise
descritiva,
através
Resultados
de
medidas
de
tendência central e dispersão, foram aplicadas para variáveis
intervalares,
e
através
de
proporção
e
Durante o período de julho de 2006 a fevereiro de 2007,
foram
registrados
dados
de
191
mulheres
frequência para variáveis nominais. Estatística infe-
primíparas que realizaram parto vaginal. Desses, 15
rencial,
prontuários não especificaram a posição de parto
através
de
análise
bivariada
(teste
qui-
quadrado), foi aplicada para investigar correlação
vaginal, sendo excluídos da análise. Foram investi-
entre posição de parto vaginal (variável indepen-
gados, portanto, os dados de 176 mulheres primí-
dente) e ocorrências obstétricas (variáveis depen-
paras que realizaram parto vaginal nas posições hori-
dentes). O teste t-student foi usado para investigar a
zontal ou vertical. A idade média das mulheres foi de
influência da posição de parto (variável indepen-
22,8 anos (DP=4,4 anos), a mediana foi de 22 anos e
neonatos
a moda de 19 anos. Dos 176 partos vaginais ocor-
(variáveis dependentes). Para todas as análises infe-
dente)
sobre
as
características
dos
ridos, 94 (55,4%) foram horizontais e 82 (44,6%)
renciais foi considerado o nível de significância (α)
verticais.
igual a 0,05. O cálculo amostral foi feito de acordo
Com
relação
à
prevalência
das
variáveis
com a análise de poder estatístico para o teste qui-
obstétricas, a laceração perineal espontânea, docu-
quadrado.15 Para tal, assumiu-se uma força média de
mentada para 166 mulheres, ocorreu em 103 casos
correlação entre a variável independente posição de
(62%), sendo 62 casos (37,4%) de lacerações de 1º
parto e cada variável dependente investigada; desta
grau,
forma foram considerados dois graus de liberdade
(1,2%) de lacerações de 3º grau (Figura 1). Não
(associação bivariada), nível de significância igual a
foram registradas ocorrências de laceração perineal
5%, força de correlação de 0,3 e poder estatístico de
de 4º grau. Com relação à distribuição da ocorrência
0,95. O tamanho da amostra foi então definido em
de laceração perineal, foram documentados 47 casos
172
participantes.
foram
realizadas
Todas
as
através
análises
do
39
casos
(23,4%)
de
2º
grau
e
dois
casos
estatísticas
(50%) em mulheres que realizaram parto horizontal
estatístico
e 56 casos (68%) em mulheres que realizaram parto
pacote
StatView.
vertical. (Tabela 1)
Essa pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética
A episiotomia, documentada para 168 mulheres,
em Pesquisa (COEP) do Hospital Sofia Feldman, sob
ocorreu em 19 casos (11%), sendo 17 (18%) em
Tabela 1 Distribuição das ocorrências obstétricas relativas à posição de parto vaginal e suas associações com as posições de parto horizontal e vertical, em 176 mulheres.
Variáveis obstétricas
Parto horizontal
Parto vertical
n
%
Realização de episiotomia
17
18,0
2
2,5
Uso de ocitocina
39
41,4
30
36,6
0,4
Presença de laceração perineal
47
50,0
56
68,0
0,3
Presença de sutura perineal
49
52,1
49
59,8
0,6
1
1,0
0
-
-
Instrumentação cirúrgica
n
p
%